Pronunciamento de Ronaldo:
Como vocês devem imaginar, como ouviram falar no fim de semana, eu estou aqui hoje para (fiz cola e não vou conseguir falar nada) falar que estou encerrando minha carreira como jogador profissional. E dizer que essa carreira foi linda, emocionante, de muitas derrotas e infinitas vitórias. Fiz muitos amigos, não lembro de ter feito nenhum inimigo. Enfim, estou antecipando o fim da minha carreira por alguns motivos importantes. Todos sabem aqui do meu histórico de lesões. Tenho tido nos últimos dois anos uma sequência muito grande de lesões, que vão de um lado para o outro, de uma perna pra outra, de uma músculo para o outro. Essas dores me fizeram antecipar o fim da minha carreira. Há quatro anos atrás, no Milan, eu descobri que sofria de um distúrbio que se chama hipotireoidismo, que desacelera o seu metabolismo. Para controlar esse distúrbio teria que tomar hormônios que não são permitidos no futebol, porque seria doping. Muitos podem estar arrependidos por terem feito chacotas com meu peso. Não guardo mágoas de ninguém. Queria explicar isso no último dia da minha carreira. Tenho muitos agradecimentos a fazer aqui. A todos os clubes que passei: São Cristovão, Cruzeiro, PSV da Holanda, Barcelona, Inter de Milão, Real Madrid, Milan. Ao Corinthians agradecerei daqui a pouquinho. A todos os jogadores que jogaram comigo e os que jogaram contra. Os que foram leais e os que foram desleais. Treinadores com os quais tive grande relação ou com outros que tive alguma divergência de opiniões profissionais. Agradecer aos meus patrocinadores. Em primeiro lugar à Ambev e à Nike que estão comigo desde que eu tenho 17 anos de idade, acreditaram em mim e que, com certeza, continuaremos juntos em outros projetos. Quero agradecer à Claro, que é meu patrocinador atual, por ter acreditado em mim também. Mas principalmente agradecer à Hypermarcas que bancou esse projeto Corinthians. Projeto que idealizamos eu e o presidente em um café da manhã no Rio de Janeiro, onde o Fabiano Farah, que durante nove anos foi meu agente, discutia com Luís Paulo Rosemberg, diretor de marketing do Corinthians. Entramos eu e o presidente para tomar café, apertamos a mão e definimos que eu seria do Corinthians, que poderia trazer o contrato e que se fosse em branco eu assinaria. Foi o que aconteceu. Nos primeiro meses nós não tivemos um patrocinador forte, aí veio a Hypermarcas, que está com a gente até hoje. Quero agradecer a minha família. Quero agradecer a todos os críticos no geral. Todos vocês que me criticaram e que me ajudaram a ser mais forte em cada momento da minha vida. Quero agradecer a toda a torcida brasileira, que vibrou comigo, torceu por mim, que chorou comigo e caiu junto comigo quando eu caí. Mas dessa torcida brasileira quero agradecer à torcida do Corinthians porque eu nunca vi uma torcida tão empolgante, tão apaixonada, tão entregue assim a um time de futebol. Certo que em algumas vezes essa cobrança por resultados faz dessa torcida um pouco agressiva, um pouco fora do controle. Mas em algumas outras entrevistas eu falei que eu não imaginava realmente ter vivido sem o Corinthians. Quero agradecer ao presidente (Andrés Sanches) e pedir desculpas publicamente por ter fracassado no projeto Libertadores. E dizer que você é meu irmão, que a história aqui foi linda, maravilhosa, que continuarei ligado e vinculado ao clube da maneira que você quiser, presidente. Muitas vezes vocês vão me ver no estádio torcendo para o Corinthians. Tentar fazer um jogo da velha aqui (risos). Eu estava muito pior quando fui falar com os jogadores. Agradeci a todos e ao Tite por cada minuto e cada segundo que estive com eles. E como eu sempre fiz desde o primeiro dia que eu cheguei aqui, foi que nos momentos mais difíceis eu vou entrar na frente deles para receber todo e qualquer bombardeio. Agora farei do lado de fora, talvez com menos força, porque a minha força sempre foi responder tudo dentro de campo, né. O meu futuro já está bem organizado, vou me dedicar a minha agência. Daqui a um tempo nós vamos anunciar a Fundação Criando Fenômenos, que espero me dedicar há muito tempo também. E é isso.
Ronaldo com os filhos Alex e Ronald na despedida do futebol
(Foto: Marcos Ribolli / GLOBOESPORTE.COM)
Palavras do presidente Andrés Sanches:
É um momento triste. Agradecer ao Ronaldo. Ele não era apenas um jogador, era parceiro, é parceiro. Colocou o nome do Corinthians onde nós nunca imaginávamos. Perdemos campeonatos, ganhamos campeonatos, ganhamos patrocínios. Tenho a agradecer ao Ronaldo. Como brasileiro, muito obrigado por tudo. Como presidente, muito triste, não era o que a gente tinha programado. Corinthians antes, durante e depois de Ronaldo. Somo gratos a tudo. O meu muito obrigado a, antes de jogador, esse ser humano com seus defeitos e suas virtudes. É o maior ídolo que a gente tem no mundo como atleta e ser humano
São abertas as perguntas para o jornalistas:
É como se fosse a primeira morte?
Parece que eu estava essa semana. Depois de mais uma lesão no adutor eu refleti muito em casa e decidi que era o momento, que tinha dado o máximo, mas o máximo que nunca imaginei chegar como sacrifício. E a partir de quinta- feira, quando eu decidi, parece que eu realmente estava na UTI, em estado terminal e que agora esse anúncio foi a minha primeira morte, digamos. É muito duro você abandonar uma coisa que te fez tão feliz e que você tem tanto amor, que poderia seguir, porque psicologicamente ainda dá. Mas tenho que assumir algumas derrotas, e eu perdi para o meu corpo. Farei outras coisas no meu futuro, ligado ao Corinthians. Sabe que já estou até com saudades da concentração. Pegar a família e ir pra Itu um dia desses (risos).
Como foi resistir a pessoas querendo que mudasse de idéia. Se pudesse escolher um único momento que emocionou mais, qual escolheria?
As pessoas que estão próximas, elas sofrem comigo. Eu sinto dor em subir uma escada. Não tenho elevador dentro da minha casa. Mas todos que eu falei me entenderam na primeira vez que falei. Me doei ao futebol, fiz os sacrifícios mais duros e impensáveis que alguém pode fazer. Foi lindo demais, maravilhoso demais, foi difícil demais, lógico, mas qual a outra pergunta?
Melhores momentos:
Eu tenho dois: com a Seleção Brasileira na Copa de 2002, que foi o título mais importante. O segundo momento foi ter visto esse bando de loucos apaixonados e ter convivido com eles, me tornado um deles. Os dois foram os mais importantes.
Quando decidiu que ia parar? Como foram as últimas madrugadas?
Ronaldo chora diante coletiva de despedida
(Foto: Marcos Ribolli / GLOBOESPORTE.COM) A minha família estava viajando na quinta-feira quando eu decidi. As dores me possuíam, me consumiam e eu não conseguia pensar em mais nada. Eu fiz um esforço de memória, e esse último ano de 2010 foi um ano péssimo, de muitas lesões. Começar o ano assim, com muitas lesões; sua cabeça pensar uma coisa e você achar que vai driblar o zagueiro porque você sempre fez, eu fiquei de sexta até hoje (segunda-feira) sozinho, quebrando a cabeça para caramba.
Como explicou isso aos meninos (filhos Alex e Ronald)?
Eu expliquei para eles ontem (domingo). O Ronald já entende bem mais. Todas as perguntas que vocês fizeram ele já me fez ontem. O Alex, como vocês podem perceber, não está muito ligado. Tentei copiar do Washington, que encerrou a carreira ao lado das filhas, mas não deu muito certo (risos).
Ronaldo fala com Alex:
Vai jogar no meu lugar?
Em que você poderia ser mais útil para o Corinthians?
Direção não. Comissão técnica também não. Eu serei uma espécie de embaixador técnico e institucional para levar o nome do Corinthians mundo afora
Você serve como exemplo?
Ronaldo com a taça da Copa de 2002 (Foto: Reuters) Temos que assumir tudo que envolve a ser um grande campeão. Um grande campeão não é só dentro de campo. Acho que minha parcela de culpa é muito grande, mas sou humilde para assumir qualquer erro que tenha cometido, qualquer deslize. Mas não sei se isso serve de exemplo. Eu sempre faço as coisas tentando ser o mais correto possível para mim e para os outros . Eu sou eu e sou assim. Fui o primeiro a falar isso que estou falando para o presidente dentro do vestiário na Colômbia. Futebol é assim: se ganha, se perde e estamos sujeitos a tudo isso.
O que mudaria na carreira? Planeja jogo de despedida?
Não faria nada. Talvez se a minha história voltasse a ocorrer, a medicina teria avançado muito mais e meus problemas, que no momento foram gravíssimos, em um momento futuro porderia ser resolvido mais fácil. Foi tudo muito maravilhoso. Vou sentir muita saudade e não sei como vai ser daqui para a frente. Essa saudade de voltar a jogar daqui para a frente, aquela sensação de protagonismo, de fazer o gol da vitória, mas deu a hora. Jogo de despedida por enquanto não, mas em junho ou julho vamos fazer alguma coisa, tentar reunir jogadores que estiveram comigo e fazer uma festa de despedida. Vou informando vocês.
Projetos "criando fenômenos" ainda é só uma ideia?
Ainda está desenvolvendo. É um projeto que sempre tive vontade, mas eu ia precisar de muito tempo para tocar esse projeto. Já temos o nome registrado, tudo que precisa para essa fundação funcionar. Agora tenho o principal que é tempo também. Vamos tocar ela também
Qual foi o momento mais difícil?
Os momentos difíceis foram as duas lesões gravíssimas que me tiraram três anos e meio, quase quatro anos da carreira e as seqüelas.
O que dizer ao primeiro treinador do São Cristóvão (Alfredo Sampaio)?
O primeiro cara que acreditou em mim. Eu jogava na categoria infantil e já estava jogando no juvenil. Ele estava no júnior e me tirou do juvenil. Eu fui jogar no São Cristovão. Ele era duro para caramba, cresci levando esporro para cacete. Um grande abraço! Você fez parte.
A busca pelo físico perfeito precisa acabar?
Eu acho que a busca pela perfeição é ótima. Acho que os campeonatos não deveriam ter tantos jogos, porque a longo prazo você sofre lesões. Eu vejo vários comentaristas se perguntando o porque das lesões. São muitos jogos, estamos sempre explorando muito nosso corpo, buscando nossos limite. Isso não é saudável, diferente de correr no parque, na academia. A busca do futebol profissional é sugar o máximo do atleta para que ele renda o melhor. E isso a longo prazo cria muito problemas
O Corinthians sabia do hipotireoidismo?
O Corinthians sempre soube de tudo. A minha decisão sempre foi voltada para o meu coração. O meu amor fez superar barreiras gigantes. O que para umas pessoas normais emagrecer já é difícil, para mim é mais ainda por causa do hipotireoidismo. Desacelera o metabolismo. Eu sempre quis jogar e banquei todo o sacrifício para ter condições de jogar.
Se o Alex(filho) perguntar o que foi passar pelo Corinthians o que você diria?
Ele já é corintiano. Mais alguns anos e ele será um louco corintiano também. Qual o time você torce?
Alex responde:
Corinthians.
Teve algum outro momento da carreira que chegou tão perto de tomar essa decisão? Como ficam os patrocinadores?
Tive próximo, sim, de tomar essa decisão no dia seguinte da eliminação da Libertadores e esperei um tempo mais.
Andrés Sanches responde:
Continua tudo normal com Corinthians, Ronaldo e Neoquímica até o final do ano.
Você conquistou todos seus objetivos? O que faltou?
O brasileiro valoriza sim o seu ídolo e idolatra seu ídolo. Talvez menos que em outros lugares. E o que faltou: a Libertadores
De que maneira pesaram os protestos da torcida na decisão?
Nenhum momento nisso! Acho que os protestos jamais podem ser violentos e eu não levei em consideração nenhum momento esses protestos para tomar a decisão que estou tomando hoje.
Ranking de derrotas?
Não tem ranking, está ali, eu não classifico minhas derrotas, não. Sem desmerecer nenhuma vitória, as derrotas vêm sempre para te ensinar alguma coisa. Você aprende mais perdendo do que ganhando. Foi bom ter perdido porque me ensinou muito, principalmente como homem, para me comportar na sociedade
Andrés Sanches entrega a camisa para Ronaldo (#PRASEMPREFENOMENO) e finaliza a despedida do Fenômeno.
Ronaldo ganha camisa na despedida do Corinthians
(Foto: Marcos Ribolli / GLOBOESPORTE.COM)