Legislação, que entra
em vigor na quarta (16), obrigará governos e órgãos federais, estaduais e
municipais a fornecer dados requisitados pelos cidadãos. Informações
que coloquem em risco a 'segurança nacional' permanecerão em sigilo por,
no máximo, 25 anos
São Paulo – A partir desta semana,
a administração pública brasileira, em todos os níveis, ficará
mais transparente e suscetível ao controle da sociedade. Pelo menos
no papel. Na quarta-feira (16), passa a vigorar no país a Lei
12.527, conhecida como Lei de Acesso à Informação (LAI). O texto
vem regulamentar alguns princípios constitucionais que, desde 1988,
asseguram a todos os cidadãos o direito de receber informações
públicas de interesse particular ou coletivo – e define a
obrigação do Estado em fornecê-las.
“O cidadão paga as
contas do Estado. Portanto, tem o direito de entender o que está
acontecendo com seu dinheiro, não apenas do ponto de vista
financeiro, mas também no que se refere às decisões que o Estado
toma em seu nome”, defende Guilherme Canela, assessor regional da
Unesco para o Cone Sul. “O acesso à informação geralmente leva à
melhora das políticas públicas. A tendência é que, quanto mais
transparente, menos corrupto será o Estado.”
Com esse espírito, a
LAI foi sancionada pela presidenta Dilma Rousseff em 18 novembro de
2011. Teve um prazo de seis meses para que entrasse em vigor, até
porque é uma legislação extensa. Em seus 47 artigos, repletos de
parágrafos e incisos, a lei reconhece o acesso à informação como
um direito fundamental, e define que todos órgãos dos poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário, nas esferas federal, estaduais
e municipais, além das empresas e autarquias públicas, deverão
conceder, em no máximo 20 dias, todos os dados que lhes forem
requisitados. Ou quase todos.
Sigilo
Alguns documentos
poderão permanecer longe dos olhos do povo. De acordo com a LAI,
sigilosa é a informação que, uma vez divulgada, pode colocar em
risco a segurança da sociedade e do Estado. Isso significa trazer
perigo à integridade do território nacional, à defesa e à
soberania do país; à condução das relações internacionais; à
vida, à segurança e à saúde da população; à estabilidade
financeira, econômica ou monetária; às estratégias das Forças
Armadas; ao desenvolvimento científico e tecnológico; à segurança
das instituições e autoridades nacionais; e às atividades de
inteligência do país.
Mas as informações
que se enquadrarem nos quesitos acima não ficarão eternamente sob
sigilo, como ocorria até então. O secretismo agora tem limites
legais: 25 anos para informações ultrassecretas; 15, para as
secretas; e 5, para as reservadas. O tempo é contado a partir da
data de produção dos documentos. Informações pessoais –
relativas à vida privada, intimidade e honra – também ficam
protegidas. Neste caso, o prazo é de cem anos.
Há dados, porém, que
escapam a qualquer sigilo. “Não poderá ser negado acesso à
informação necessária à tutela judicial ou administrativa de
direitos fundamentais”, define a LAI, incluindo nesse grupo as
violações dos direitos humanos por agentes públicos. Daí que a
nova legislação crie expectativa positiva nas organizações civis
que lutam pela abertura dos chamados “arquivos da ditadura”. Por
outro lado, o texto não interfere no funcionamento das leis que
asseguram os sigilos bancários, telefônicos, postais, industriais
ou econômicos – ainda que se tratem de empresas, entidades ou
personalidades públicas.
“Até agora, tínhamos
regras sobre o sigilo das informações, mas não sobre o acesso”,
lembra Izabela Correia, coordenadora de Promoção da Ética,
Transparência e Integridade da Controladoria-Geral da União (CGU),
órgão que está encarregado de conduzir o processo de adequação à
LAI no âmbito da administração federal. “O Brasil já era
considerado um país aberto, sobretudo depois da aprovação da Lei
de Responsabilidade Fiscal, em 2000. Mas tínhamos essa dívida com a
sociedade.”
Punições
A LAI determina que a
divulgação das informações deve ser a regra geral para todo o
setor público brasileiro. O sigilo passa a ser exceção. Aliás, o
ideal é que a transparência seja um valor ativo do Estado:
espera-se que as informações sejam disponibilizadas
independentemente de solicitação. Caso a requisição seja
necessária, a lei pede que os órgãos da administração federal
criem Serviços de Informação ao Cidadão (SIC) para centralizar e
atender os pedidos – é a chamada transparência passiva.
Para reduzir o poder do
funcionário público sobre os dados estatais, estão previstas
punições administrativas para aqueles que se negarem a fornecer os
dados requisitados pela população. Vão de simples multas até a
demissão, passando por processos judiciais. Quem destruir, alterar
ou extraviar documentos também estará enrascado. Da mesma maneira,
a lei define sanções àqueles que divulgarem dados ultrassecretos,
secretos ou reservados. “O acesso à informação classificada como
sigilosa cria a obrigação para aquele que a obteve de resguardar o
sigilo”, diz o texto.
Para fazer-se cumprir,
a LAI prevê ainda a instituição de uma Comissão Mista de
Reavaliação de Informações, que terá a palavra final sobre a
sigilosidade – ou não – das informações. No entanto, esse
órgão terá efetividade apenas no âmbito federal. As esferas
estaduais e municipais deverão estabelecer seus próprios mecanismos
legais para garantir o conteúdo da lei.
“Ainda não há
definição oficial sobre o formato da Comissão Mista”, esclarece
Izabela Correia. A coordenadora da CGU explica que estas e outras
lacunas eventualmente deixadas pelo texto da LAI serão preenchidas
por um decreto presidencial a ser publicado até quarta-feira, dia em
que a lei passa a vigorar.
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